O voo da Palmeira
Enquanto Lisboa trafega pelo
Rio
Pairando sobre nos a semiótica
Dos velhos Deuses de papel
– o Sol é o Deus deste país –
você disse a mim
5km NE, Lisboa
você trouxe a bandeira brasileira
e o arsenal do sabiá?
Calma, eu disse a você
Ainda estamos nas múltiplas
Chances de nos perder
Antes de descobrir Portugal
Palavras em algum poema mortal
Que certamente sacamos do bolso
Como as estatísticas
Letais.
E você disse
Lembra daquela palmeira
Em Copacabana?
Um filho português certa vez
Embarcou no mar e o abarcou
Você acha que aquela
Palmeira um dia
Ha de abarcar o mundo?
O mundo se aglomera
Nos homens
Os homens se aglomeram
No mundo
E então você colocou
Um pouco da velha carne no
Bolso, numa arte impossível
E eu juro que esperava
Um poema que alinhasse
As múltiplas mortalidades
De um poema
mas não:
Era só sua moeda preferida.
E você disse
Lançaremos ela ao grande
Navegador dos mares, o vento
Antes que ele descubra Portugal
Cara: cara
Coroa: a palmeira
Abarcará o mundo
E naquela época, prestes
A descobrir o futuro da
Sua moeda
Eu escrevia poemas num idioma
Que destronou o grande poeta
Americano
Com canetas que perderam-se
Da tampa e do tempo
E então você disse
Você é tão fotogênico
Sob meus olhos
E a beleza disto tudo
Um dia há de chamar-se
Saudade
Não sei se caberíamos
Na fotografia do poema do 11 de setembro
De Szymborska
Mas sei muito bem que sim
E então você disse
O sonho;
Coloca-o na vida
Não na obra
Acho que a tendência estatística
Da poesia
É despertar mais rápido
Do que a vida.
O primeiro verso é um pesadelo
It’s a nightmare
We’re heading to Lisboa
O ultimo verso
Continua sendo o primeiro
Por isso tão fácil é
Despertar das palavras.
É sempre bom, você disse
Ter algo para odiar
No bolso impar que calca 42
Talvez 43
Não leia The New Yorker
Eles não entendem
A geometria psicanalítica
A mente se expande e se retrai
Isso chama-se espaço
ID, ego e superego
O tudo em ti
Não é o todo.
E então eu disse, avistava Lisboa
O mundo se aglomera nos homens
Os homens se aglomeram no mundo.
Essa foi a única resposta
Que eu tinha para lhe dar
– eu adorava repetir seus conceitos
eternos, apesar de saber que eles eram finitos
em minha boca suja de silêncio –
não queria te dizer
que o perímetro espacial do inconsciente
fosse uma guerra
na qual os números
jamais venceriam.
Porque você sabe,
Despertar-nos era algo
Que meus mapas não sabiam
Fazer.
Coloquei as mãos no calibre 42
De meu bolso e retirei uma dose
Do velho silêncio
E Você disse
Bandeiras não falam
Nem despertam
Não ha som nas colisões
Neuronais
O grande viajante, o vento
Qual será sua nacionalidade?
Até que eu disse
Nós poderemos
Não poder
A eternidade
E talvez isso seja o
Mais perto
Que chegaremos dela.
E então você não disse
Nada.
Ao chegarmos em Portugal
A moeda voou pela Palmeira
E caiu no chão de Lisboa:
Foi então que
Eu vi
A coroa.
– Augusto Soares.
Guilherme, és, sem dúvida alguma, um grande poeta.
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muito obrigado, amigo.
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